Hoje de manhã acordamos para um momento
Chamberlain. Com os mesmos sorrisos, apertos de mão e tapinhas nas costas trocados
quando o primeiro ministro inglês abandonou os Sudetos checos para Hitler em
1938 - supostamente para evitar a guerra - os líderes do mundo nos asseguraram
nesta madrugada que a situação com o Irã estava salva e que Israel e os países
do Golfo Árabe estavam finalmente seguros.
John Kerry logo tomou o pódio para
explicar que este foi um acordo interino, válido por apenas 6 meses pelo qual o
Irã concordara em suspender o enriquecimento de urânio acima de 5% e se
comprometera a desmantelar a infraestrutura técnica para enriquecimento a
níveis maiores contra um relaxamento modesto das sanções internacionais. Além
disso, o Irã teria concordado em neutralizar sua reserva de urânio já
enriquecido a 20% e abrir suas usinas para inspeção e monitoramento da Agência
Internacional de Energia Atômica.
O “relaxamento modesto” das sanções
referido por Kerry significa que os Estados Unidos, Inglaterra, França,
Alemanha, China e Russia, os chamados P5, não imporão novas sanções. As sanções
existentes contra certos setores da economia iraniana seriam suspensas além do Irã receber 7.2 bilhões de dólares em fundos congelados.
Obama descreveu este acordo como o “primeiro
passo para uma solução compreensiva” e que se o Irã não cumprisse com suas
obrigações, ele poderia ser anulado e as sanções restituídas.
Pela experiência de todos os acordos
interinos que Israel assinou e não cumpridos pelos palestinos, gostaria de
saber se um só foi anulado e a situação revertida. Todos os acordos interinos,
infelizmente, uma vez implantados, não há caminho de volta.
Alguns senadores americanos já reagiram
ao acordo. Mark Kirk to estado de Illinois disse que este era um presente de
bilhões de dólares ao maior patrocinador do terrorismo mundial em troca de
concessões cosméticas e Marco Rubio da Florida que disse que este acordo é um
insulto aos aliados americanos que já duvidam do comprometimento americano com
sua segurança.
Obama ainda pediu ao Congresso americano
para não aprovar novas sanções contra o Irã para não minar este acordo que na
opinião dele “impede o Irã de construir uma arma nuclear”.
O novo presidente Hassan Rouhani
endossou o acordo na televisão nacional hoje dizendo que o mundo finalmente
reconhecera os “direitos do Irã à energia nuclear” mesmo que esta linguagem não
esteja contida no acordo.
Hoje sentimos a falta de um Churchill. Alguém
carismático que pudesse galvanizar a opinião pública a entender que apesar do
mundo dizer que este é um bom acordo, não é a coisa certa a fazer.
A única voz solitária foi a do primeiro
ministro de Israel Benjamin Netanyahu que chamou o acordo de um “erro histórico”.
A cegueira mundial face ao projeto
nuclear iraniano não é o único problema aqui. O próprio comportamento da comunidade
internacional sobre o Irã é problemático. Nesta última quarta-feira, às
vésperas da assinatura deste acordo, o Supremo líder do Irã, Ayatolah Ali
Khamenei, falou sobre Israel usando expressões como “cães sionistas” que não
iriam “sobreviver”. Nenhuma só palavra
por qualquer uma das potências presentes nas negociações em Genebra foi proferida
em protesto.
Quando jornalistas questionaram as
delegações europeias e americana sobre as palavras violentas usadas por
Khamenei, as delegações escolheram simplesmente ignora-las. Porque estragar a
nova realidade com fatos?? Afinal, não temos hoje um novo Irã com sorrisos
doces de Rouhani??
Teerã se deu conta que Washington e
Moscou estavam desesperados por um acordo e por isso Khamenei não poupou a
língua com este discurso inflamatório.
Enquanto pensamos que o Irã foi trazido
à mesa de negociação pelas sanções e posição de força que elas geraram, foi o
desespero de Obama, de Catherine Ashton, e de Lavrov que forçou a capitulação
do ocidente. As sanções serão levantadas e como ocorreu com a Coréia do Norte,
elas não serão revertidas mesmo com os testes nucleares que não tardarão a vir
por parte do Irã.
Mas este acordo dá a estes diplomatas
ansiosos pelo glamour das câmeras a oportunidade de voltarem para seus países
como vitoriosos. John Kerry continuará a retratar Netanyahu como um
rejeicionista e que nenhum acordo seria bom o suficiente para Israel. Esta será
a desculpa que a América usará daqui a 6 meses quando os palestinos abandonarem
a mesa de negociação.
A lógica de Netanyahu será vindicada: daqui
a 6 meses o ocidente assinará um mau acordo qualquer que seja ele porque Obama
não vê outra coisa a não ser agradar os Ayatolas.
Com toda esta retórica de anulação do
acordo em 6 meses, se o Irã não cumprir com sua parte, Kerry e seus negociadores
querem ser vistos pelo Congresso americano como “protetores” de seus aliados.
Os iranianos, com seus discursos venenosos, também querem parecer agressivos e
duros. Os franceses querem que os sauditas apreciem sua firmeza e lhes dêem alguns
contratos lucrativos. O mesmo com a China. A Russia quer preservar seu
lucrativo relacionamento com o Irã, suas bases na Síria e tentar semear boa
vontade com países sunitas.
Kissinger uma vez disse que a política
externa americana é só uma manifestação da política interna e ela só tem um
propósito: extrair milhagem com os eleitores.
Depois que os eleitores de cada país se
convencerem que cada um de seus representantes foram os vencedores nas
negociações, as partes se encontrarão mais uma vez em Genebra para assinarem um
acordo final que retirará por completo qualquer pressão dos Ayatolas abrindo
o caminho deles para a bomba nuclear.
Se a
história nos serve de guia, a profecia de Netanyahu irá se cumprir. É muito
raro que nações se sentem à mesa e não consigam chegar a qualquer acordo. Mas às
vezes as diferenças não podem ser superadas. Apesar de muito difícil, isto
ainda pode acontecer, especialmente em se tratando de um acordo ruim acompanhado
da retórica ofensiva e beligerante que estamos vendo do Irã.
Agora, a única coisa que temos a fazer é
esperar que somente um acordo que exija o desmantelamento completo do programa
nuclear do Irã seja assinado daqui a 6 meses e que se este não for o caso, que
Israel, com seus novos “aliados” do Golfo Árabe, possam cooperar para fazê-lo
sozinhos.