Por mais de 100 anos, a Esquerda se opôs à Direita Sionista e
lutou para garantir que ela não pudesse influenciar efetivamente a composição
social ou cultural de Israel.
A Declaração de Independência de Israel,
de 1948, contém 650
palavras em seu texto hebraico original. E os ativistas que são
contra a reforma do
judiciário do país, exigem
que seus princípios estejam no centro da atual crise no que diz respeito à
composição e direção das cortes e outras instituições jurídicas.
Na última quinta-feira, esta esquerda orquestrou o
“Dia
da Interrupção”
em que seus ativistas resolveram bloquear algumas artérias viárias do país.
Crianças de creches foram levadas para as calçadas para gritarem “de-mo-cra-ti-ya”
instigadas por seus professores. É difícil acreditar, mesmo em Israel, que crianças
desta tenra idade, tenham
qualquer ideia do que seja ou de como funciona a democracia. Verdade seja dita, se
em vez de “de-mo-cra-ti-ya” as crianças estivessem gritando “Kim Jon Um”, aquela demonstração
poderia ter acontecido
em Pyongyang.
É bem possível, porém, que Yair Lapid, do partido Yesh Atid,
tenha se formado numa classe partidária dos métodos da Coreia do
Norte. E
certamente ele não leu a Declaração de Independência de
Israel com o cuidado
necessário.
O
interessante é a hipocrisia da esquerda. Em 2005, quando Sharon forçou milhares
de judeus de suas casas na Faixa de Gaza, houve uma onda de protestos sem precedentes
em que jovens também tomaram as ruas, fazendo bloqueios. Na época, o jornalista
Yair Lapid, escreveu uma coluna na qual ele exigia que os manifestantes que participaram
destes bloqueios fossem removidos pela polícia de imediato, à força se necessário.
Quando confrontado com este seu artigo, Lapid respondeu: "Estou farto de comparações com o que era
então ... é diferente ... anos se passaram, as circunstâncias são diferentes,
as pessoas são diferentes ... é um mundo totalmente diferente." Diferente?
Não. Não é diferente. Quando há manifestações de ultra-ortodoxos ou de etiópios,
como ocorreu em 2019, a resposta do governo foi rápida para tira-los seguindo
uma ordem do Supremo Tribunal. Isso cheira a um conflito de classes sobre identidade nacional e
cultural. Não sobre democracia.
Israel está
constantemente questionando sua democracia e se comparando com os Estados
Unidos. Mas a palavra
“democracia” não aparece na Declaração de Independência israelense. A Declaração de Independência dos
Estados Unidos também não inclui o termo. Mas, desde 1641, várias leis
promulgadas autorizaram, por exemplo, a escravidão até 1865. Os
Estados Unidos não são uma democracia governada pela maioria. São uma república
constitucional, em que a Constituição estabelece de modo claro, os limites dos
três poderes do Estado: o executivo, o legislativo e o judiciário. Israel não
tem uma constituição e é por isso que o Judiciário conseguiu abocanhar para si
o poder de governar do país.
Um elemento central da democracia é a proteção igualitária
perante a lei. É nisso que o campo secular, de liberal a progressista,
se concentra, sempre apontando o dedo aos ultra-ortodoxos em relação ao serviço militar,
pagamento de impostos, emprego remunerado, bem como as orações igualitárias no Muro das Lamentações.
Mas o conceito de igualdade lhes escapa quando se trata do direito dos
ultra-ortodoxos de protestarem. Aí eles devem ser devidamente removidos das
ruas o quanto antes.
O campo
secular esquece que na Declaração da Independência está que Israel “promoverá o desenvolvimento
do país para o benefício de todos os seus habitantes”; que será “baseada na
liberdade, na justiça e na paz”; que irá “assegurar total igualdade de direitos
sociais e políticos a todos os seus habitantes, independentemente de religião,
raça ou sexo”, entre outros objetivos elevados. Os habitantes árabes se
beneficiariam de “cidadania plena e igualitária e devida representação”. Isso é
o que constitui uma democracia pura. O governo eleito pela maioria
que garante os direitos das minorias. Mas há equilíbrio entre os poderes?
Não. Na
década de 90, o Presidente do Supremo, Aharon Barak fez uma reforma judiciária
sozinho, declarando o Supremo o juiz final de tudo e todos, incluindo sobre
decisões do executivo e leis aprovadas pela Knesset.
Na raiz da reforma judicial iniciada por Yariv Levin e Simcha
Rothman está a volta do Supremo para o que era antes de Barak
e em especial lidando com quatro questões principais:
A primeira é
sobre a cláusula de anulação de decisões
do Supremo. Isto porque a Knesset, que foi eleita pelo povo, pode aprovar uma
lei com o consenso tanto da coalisão como de membros da oposição e o Supremo
pode dizer que de acordo com a opinião de 3 juízes, que não foram eleitos pelo
povo, esta decisão não é “razoável” e anular a lei. O que a reforma quer fazer
é dizer: ok, neste caso, vamos submeter esta decisão do Supremo ao voto da
Knesset e se a maioria rejeitar a decisão, ela fica anulada e a lei será válida.
A segunda
questão é sobre a
nomeação de juízes. É inconcebível que juízes de uma corte nomeiem
e aprovem os seus sucessores que acabam tenho a mesma cor e posição ideológica
deles, sem espaço para divergências. A esquerda não aceita que a nomeação de juízes
seja feita por políticos. E porque não? Porque eles querem que as cortes
continuem a refletir a mesma cor e ideologia deles.
A terceira razão
é o qualificador
“razoabilidade” das decisões judiciais que é um critério
completamente subjetivo e como quando estudamos na Faculdade de Direito, a lei
tem que ser aplicada objetivamente. Como Israel não tem uma Constituição, que imponha
limites ao Supremo, ele simplesmente se dá o direito de anular decisões de
estado e da Knesset baseado num critério subjetivo.
A quarta
questão é a do papel do advogado-geral e dos assessores jurídicos
ministeriais. Hoje, a advogada-geral de Israel, nomeada pelo governo
de esquerda de Yair Lapid, está num confronto aberto com o governo atual, se
recusando ou adiando a tomada de decisões que precisam de seu selo de
aprovação. Nenhum governo pode funcionar eficientemente deste modo. O problema
é que tradicionalmente o cargo não tem um tempo fixo e é ela quem tem que decidir
sair. Levine quer mudar isso.
Mas como disse há duas semanas, essas são apenas representações
externas de um conflito interno mais profundo que está vindo agora à tona. Quem vê os
manifestantes que saem às ruas todas as semanas, eles são os privilegiados da indústria
High-tech, da indústria financeira, são seculares, e ferrenhamente de esquerda,
que não se conformam com a volta de Netanyahu e da direita ao leme do país. Não
vemos etiópios, mizrachim ou árabes nas ruas. Só a elite que quer, a todo o
custo, reverter o resultado da última eleição.
A briga então
não é sobre democracia (que nenhum dos manifestantes consegue explicar como ela
estaria em perigo). É simplesmente sobre quem controla as instituições de poder. Batya Ungar-Sargon,
da revista Newsweek, comentando sobre o fenômeno da política progressista, disse
que o que está
acontecendo em Israel são pessoas furiosas que abandonaram os interesses
econômicos para travar uma guerra cultural para impulsionar seus próprios valores.
Esses valores incluem um marcado processo de secularização
(e o correspondente abandono dos valores culturais originais que estão no âmago
da criação do Estado de Israel) e a imitação do comportamento progressista da esquerda ocidental. Os progressistas
chamam o governo de Netanyahu de “fascista”, “nazista”, “talibã” e outros para
se referir a qualquer posição de direita sem explicar em que medida o governo é
fascista ou nazista.
Isto leva a
uma quebra dos padrões sociais e éticos que tomam o lugar do debate
construtivo. Simcha Rothman e Yair Levine se dispuseram a conversar. De fato, o
comitê da Knesset que está debatendo a reforma se reúne quase diariamente e
todos têm o direito à fala. Além disso, os debates são integralmente
televisados. Muito mais transparente do que a nomeação e a aprovação de juízes.
Se houvesse
conversa em vez de ataques, poder-se-ia chegar a um consenso sobre o número de
legisladores necessário para anular uma decisão do Supremo que inclua uma parte
da oposição; talvez incluir critérios mais objetivos do que “um amigo traz o
outro” para o Supremo; mas Lapid exige uma cessão total dos trabalhos da
Knesset sobre a reforma do judiciário somente para se sentar à mesa.
E no meio
tempo, os terroristas se aproveitam da situação, como vimos em Tel Aviv na 5ª feira
à noite e os inimigos de Israel ficam à espreita.
Mas tudo isso
irá se resolver. Não é a primeira vez que Israel passa por uma crise desta. O mesmo
ocorreu quando Menachem Begin virou primeiro-ministro. Membros do governo de
Israel chegaram até a dizer que não era o governo que deveria mudar, mas o
povo. E tudo se passou bem. Com Begin Israel chegou até a fazer a paz com o
Egito. Mas aquela geração conversava, tinha respeito pelos adversários e
sobretudo amor pelo país. Precisamos disso hoje. Muita conversa, muito respeito
e sobretudo, Ahavat Israel.
No comments:
Post a Comment