Para um presidente que tropeça
mais que anda, que diariamente faz gafes e parece perdido e confuso frente às
câmeras, Joe Biden parece
de repente acordar e encontrar o equilíbrio quando se trata de se intrometer nos assuntos
internos de Israel.
Antes e depois da votação da Knesset no início desta semana que
aprovou a primeira medida da reforma judicial do governo, Biden deu o passo incomum de criticar a
legislação interna de Israel como se o Estado judeu fosse o 51º estado da América.
Agindo mais como um comentarista político do que como um
presidente, Biden lamentou a aprovação da Lei de Cancelamento do Padrão de Razoabilidade, pelo
parlamento de Israel. Já em março, Biden causou alvoroço com comentários truncados
sobre a proposta de
reforma judicial quando disse: “Como outros apoiadores de Israel, estou muito
preocupado. Estou preocupado que eles entendam isso: eles não podem continuar
por este caminho. E eu meio que deixei isso claro. Espero que o primeiro-ministro chegue a um compromisso genuíno, mas isso não
parece que irá acontecer”.
Quando um repórter perguntou a ele se isso não
era interferência, Biden
insistiu “não estamos interferindo”. Desculpe. Meu engano!
Mas quando um presidente
americano diz a Israel:
“Vocês não podem
continuar neste caminho”, isso parece muito com uma interferência, ou
não?
Mais recentemente, em 18 de julho, antes da votação do projeto de lei da Knesset, Biden foi
entrevistado por Thomas
Friedman, o colunista do The New York Times que tem um prazer infinito de criticar Israel publicamente.
De acordo com o tão falado artigo de Friedman, Biden exortou os líderes
israelenses para "não se apressarem" para aprovar a legislação, como se fosse
natural para um presidente americano opinar sobre quando um projeto de lei em uma nação
soberana a vários milhares de quilômetros de distância deve ou não
ser votada.
Uma semana depois, em uma tentativa descarada de influenciar a
votação, Biden chamou a
proposta de reforma judicial de “divisiva” e novamente instou Netanyahu a “não
apressar isso”. E ainda, ontem, 12 congressistas democratas
decidiram introduzir uma resolução em solidariedade com os manifestantes
anti-reforma.
Mas pior, depois da aprovação
da lei na segunda-feira
passada, a secretária de imprensa da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, emitiu um
comunicado denunciando a votação, declarando: “Como um amigo de longa data de
Israel, o presidente Biden expressou publica e particularmente suas opiniões de que grandes
mudanças em uma democracia para serem duradouras deve haver um consenso tão amplo quanto
possível”.
A declaração concluiu dizendo: “É
lamentável que a votação de hoje tenha ocorrido com a menor maioria possível”. Bem,
o resultado foi 64 a 0,
o que dificilmente parece constituir “a menor maioria possível”.
Não me lembro de o presidente Clinton
alertar o primeiro-ministro Yitzhak Rabin há 30 anos para não
assinar o super
controverso Acordo de Oslo, o chamado “acordo de paz histórico”, entre Israel e a Organização de Libertação da
Palestina, de 1993, que só foi aprovado por 61 votos da Knesset de 120 membros - uma margem
muito mais estreita do que a votação da reforma judicial.
Como se na América, aprovar uma legislação importante
sem o consenso da oposição é um grande problema. Não é. A Casa Branca parece bastante à
vontade com a vice-presidente Kamala Harris desempatando 31 votações
no Senado, número histórico
recorde, incluindo a tão discutida Lei de Redução da Inflação.
Para entender completamente o quão absurda e inaceitável é
essa intromissão do governo americano, imagine o que
seria se fosse o
contrário. E não faltaram ocasiões para isso.
Nos últimos dois anos, o governo Biden sofreu vários golpes da Suprema Corte americana.
A primeira anulou a
decisão Roe v. Wade sobre o aborto e outra restringiu severamente a ação
afirmativa baseada em raça nas admissões em universidades.
E como Biden reagiu a essas decisões? Ele
denunciou e deslegitimou
a Suprema Corte!
Falando na Casa Branca em 8 de julho de 2022, sobre a decisão
relativa ao
aborto, Biden disse: “O que estamos testemunhando não é um julgamento constitucional. É um exercício de poder político
bruto... Não podemos permitir que uma Suprema Corte descontrolada, trabalhando
em conjunto com elementos extremistas do Partido Republicano, tire as
liberdades e nossa autonomia pessoal”.
E em 11 de outubro, Biden atacou mais uma vez a
Suprema Corte, chegando
a dizer que ela “é mais um grupo de ativistas hoje em dia do que … imparcial”.
Não surpreendentemente, isso levou alguns democratas a buscar
seu próprio tipo de “reforma judicial”. Dois meses atrás, um grupo de senadores e congressistas
democratas anunciou que apresentaria uma legislação para expandir o número de
juízes da Suprema Corte de nove para 13, dando efetivamente a Biden a chance de
nomear a maioria de juízes liberais. Não é exatamente esse tipo de
comportamento contra o qual Biden alertou Israel tão veementemente?
Como ele se sentiria se o governo israelense se intrometesse
no assunto e expressasse sua angústia sobre o curso futuro da democracia
americana?
Israel e os Estados Unidos realmente têm um vínculo especial
e um relacionamento próximo, e por isso devemos ser gratos.
Mas não é assim que os
Estados Unidos deveriam tratar um aliado próximo.
Mas mesmo nos laços mais íntimos entre as nações, existem
algumas linhas que não devem ser cruzadas. Como Israel escolhe lidar
com suas instituições
governamentais e os pesos e contrapesos entre eles é assunto de Israel e de
mais ninguém.
Parece que nos tornamos tão
acostumados ao longo dos anos com a interferência americana nos assuntos
internos de Israel que ela não nos choca mais.
O presidente
Biden errou ao elevar a crise doméstica de Israel a uma questão política entre os
dois países. Sua postura corre o risco de causar uma erosão dos laços entre os
dois países, que só irá convencer os inimigos de Israel de que ela é fraca e
vulnerável.
Há momentos
em que é certo e apropriado que um amigo intervenha publicamente na política
interna de outro. E então há momentos em que é mais sensato manter os conselhos
a conversas privadas e as críticas discretas, mantendo o silêncio público.
Desta vez, o silêncio de Biden teria sido o caminho mais sábio.
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