Em
um de seus discursos quando jovem, Winston Churchill disse que a
responsabilidade nasce no período entre o que é notícia e o que se torna
história. Hoje vivemos este período. Com cada imagem de civis mortos, seus
corpos jogados nas ruas de Bucha, de Motyzhyn, e de dezenas de outros vilarejos
devastados pelas forças russas na Ucrânia, a cada entrevista de alguma mulher
ao lado das covas de seus familiares, o nível de frustração aumenta ao redor do
mundo.
Mas
esta é uma frustração que poderia ter sido evitada, junto com todo o sofrimento
e perda de vidas humanas. O mundo calou durante meses enquanto a Rússia juntava
tropas na fronteira com a Ucrânia, mentindo, sim mentindo dizendo que estávamos
todos paranoicos. Que nenhuma invasão estava nos planos.
Nesta
semana, a presidente da comissão europeia Ursula von der Leyen disse,
visivelmente chocada depois de visitar Bucha, que não havia palavras para
descrever os horrores que ela havia visto. Um pouco tarde demais.
Como,
no século XXI, o presidente russo, Vladimir Putin, pode se safar de
atacar descaradamente um país vizinho, sem provocação, sem qualquer motivo,
além de satisfazer seu tremendo ego, alvejando não-combatentes e matando
milhares de pessoas inocentes enquanto afirma repetidamente que suas tropas não
estão cometendo atrocidades?
A
Sky News esta semana entrevistou o porta voz de Putin Dmitry Peskov. Foi algo
nauseante ouvir este vendido ao Kremlin dizer que os mortos foram vítimas dos
próprios ucranianos e que a retirada das tropas do norte de Kyiv tinha sido um
ato de “boa vontade” para com as negociações. Isso depois de terem massacrado
toda a população de Bucha e enquanto bombardeavam impiedosamente a cidade porto
de Mariupol. Foi meia hora de tentativas de Peskov de vender um catálogo de
mentiras que chegou até a irritar o entrevistador Mark Austin e todos que o
assistiam.
Na
semana passada, os Estados Unidos e outros membros da OTAN, além de prometerem
armas para os ucranianos e a imposição de duras sanções econômicas, resolveram
isolar a Rússia das organizações internacionais.
Na
quinta-feira, a Assembleia Geral das Nações Unidas votou pela suspensão da
Rússia do Conselho de Direitos Humanos da ONU, órgão encarregado da “promoção e
proteção dos direitos humanos em todo o mundo”. A votação foi de 93 a favor, 24
contra e 58 abstenções. Entre os países que se abstiveram, o Brasil. E por quê?
Os
argumentos que o Brasil deve permanecer “neutro” nesta guerra horrenda mostra a
completa falta de um norte moral. Países que têm muito mais a perder com uma
condenação da Rússia, como por exemplo a Alemanha, não hesitaram em votar para
chutar Putin do Conselho. O Brasil se absteve por quê? Por causa de
fertilizantes? O que pesa na balança para nós agora não são vidas, mas estrume?
É isso??
O
problema é que suspender a Rússia do Conselho de Direitos Humanos é um ato
puramente simbólico. Não vai salvar uma única vida.
O
fracasso da ONU nunca foi mais visível do que nesta guerra. A Rússia,
perpetradora de atrocidades contínuas que chocam nossa consciência, detém a
ferramenta mais poderosa da diplomacia internacional: o poder de veto no
Conselho de Segurança da ONU. Nenhuma ação importante pode ser aprovada contra
o agressor porque a Rússia pode simplesmente esmagá-la.
A
pergunta que ninguém está fazendo é: com que direito? Um dos fundadores da ONU
com um assento permanente no Conselho de Segurança com poder de veto, foi a
União Soviética. A União Soviética não existe mais desde 1991. A Rússia não é a
União Soviética e teria que ter havido alguma resolução na ONU sobre o fim de
um de seus membros permanentes. Só que eu não encontrei. Parece que
tacitamente, sem ninguém fazer ou dizer nada, a Rússia simplesmente tomou para
si os poderes da falida União Soviética.
A
exasperação com a impotência da ONU foi palpável quando o presidente ucraniano
Volodymyr Zelensky se dirigiu à Assembleia Geral na terça-feira, um dia depois
de visitar Bucha, o subúrbio de Kiev cujo nome agora é sinônimo de valas comuns
e da morte de ucranianos inocentes.
Zelensky
descreveu o que viu após a retirada da Rússia: "Eles cortaram membros,
cortaram suas gargantas... Mulheres foram estupradas e mortas na frente de seus
filhos". “Onde está a segurança que o Conselho de Segurança precisa
garantir?” “Qual é o propósito dessa organização?” ele perguntou a uma
audiência envergonhada e em silêncio.
Como
Zelensky apontou, o Capítulo 1, Artigo 1 da Constituição da ONU, declara seu
propósito como a preservação da paz e da segurança. Na verdade, toda a
Constituição parece um plano para indiciar a Rússia. O artigo 2º, por exemplo,
obriga os membros a absterem-se de ameaçar o uso da força contra a integridade
territorial de seus vizinhos.
Interessante
é que entre os que votaram contra a expulsão da Rússia há uma quantidade
assustadora de infratores, o que explica por que o trabalho desta organização
virou pura piada. Entre os eleitos nos últimos anos para defender os direitos
humanos estão não apenas a Rússia, mas também a China, Cuba, Arábia Saudita,
Venezuela e outros. A paródia se estende a outras organizações. A Coreia do
Norte foi escolhida para presidir um fórum de desarmamento da ONU; o Irã para a
Comissão da ONU sobre o Status da Mulher. O único país com uma agenda fixa para
ser condenado no Conselho de Direitos Humanos, é quem? Adivinharam, Israel.
Somente
em 2020, o ano da pandemia, Israel foi condenada 17 vezes por supostos “crimes
de ocupação”. O resto dos países do mundo receberam juntos apenas 6 condenações
para a Coreia do Norte, Irã, Siria, Myanmar e duas na Crimeia.
Vocês
querem saber o que é um crime de ocupação? Olhem para Bucha. Olhem para o que
os russos estão fazendo no leste da Ucrania, esvaziando o território de sua
população, criando mais de 4.5 milhões de refugiados. Israel não chega nem
perto desta liga. Enquanto é bombardeada por mais de 12 mil mísseis vindos de
Gaza, Israel transfere ajuda humanitária para o Hamas, na forma de milhares de
caminhões por dia, além de água e eletricidade que o contribuinte israelense
acaba pagando.
Nesta
semana Israel sofreu 4 ataques terroristas que custaram as vidas de 14
inocentes. Doris Yahbas, de 49 anos, mãe de 3, Laura Yitzhak de 43 anos,
também com três filhos; Rabbi Moshe Kravitzky, de 50, pai de quatro crianças;
Menahem Yehezkel, de 67 anos, os policiais Yazan Falah, de 19 anos; Shirel
Abukarat, também de 19 anos e Amir Khoury, de 32 anos; Yaakov Shalem, 36,
deixou 5 orfãos; Rabbi Avishai Yehezkel, 29, um professor de Yeshiva e pai de
duas crianças pequenas; Victor Sorokopot, 38, and Dimitri Mitrik, 23, dois
trabalhadores da Ucraina; e em Tel Aviv na quinta-feira, Tomer Morad e Eytam
Magini ambos com 27 anos e Barak Lufen de 35 anos e pai de 3.
Não
houve avisos do Jihad Islâmico ou panfletos jogados para os civis avisando que
um ataque viria. Não, estes foram perpetrados e comemorados em Gaza e em
Ramalah com a distribuição de doces e música. Se alguém quer ver o que é uma
ocupação massacrante, que merece 17 condenações, olhem para a Rússia na Ucrânia
e não para Israel que só fez melhorar as condições dos árabes que moram na
Judeia e Samaria. Só a título de comparação, o salário médio dos árabes na
Judeia e Samaria é o dobro do salário médio dos brasileiros.
Antes
da votação de quinta-feira para suspender a Rússia do Conselho de Direitos
Humanos, o embaixador chinês alertou que a medida abriria um precedente
perigoso. Só podemos esperar que ele esteja certo e que o precedente seja
perigoso mesmo para os muitos tiranos que abusam os direitos humanos em todo o
mundo, incluindo Xi Jinpin.
Então,
alguma coisa vai mudar agora?
É
difícil ser otimista. Mas há uma pequena sensação de que a invasão da Ucrânia
está reformulando a ordem global. Se alguma vez houve tempo para repensar a
estrutura das instituições internacionais – esse tempo é agora.
Afinal,
as valas comuns na Ucrânia, os novos órfãos e viúvas em Israel e os horrores
que provavelmente descobriremos num futuro breve são a prova de que este
sistema falhou miseravelmente.
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