A reviravolta no Oriente Médio continua. Novas manifestações diárias ocorrem em Bahrain, Yemen e no Sultanato de Oman. No Egito a bagunça continua com o povo queimando prédios do governo. A Arábia Saudita prendeu clérigos shiitas e baniu qualquer protesto. Na Líbia a situação está se deterioriando e as forças de Kadafi travaram novas ofensivas que já deixaram mais de 60 mortos em 2 dias e hoje ele decidiu usar sua força aérea para bombardear seu próprio povo. Ainda não sabemos o resultado disso ou o que está se passando.
Deve ter sido mais um dedo na ferida das famílias que tiveram seus filhos brutalmente massacrados pelas autoridades líbias e que todos estes anos se recusaram a abandonar sua busca por justiça. Em 1996 Kadafi ordenou a morte de 1.200 prisioneiros, a maioria da oposição política. Em algumas horas, todos foram fuzilados na quadra da prisão Abu Salim em Tripoli. Os corpos foram enterrados em valas coletivas em local até hoje desconhecido. Só em 2004 Kadafi reconheceu que o massacre ocorrera.
As famílias das vítimas, representadas pelo ativista de direitos humanos Fathi Terbil, queria mais que uma admissão. Terbil foi preso no mês passado, e foi isso o que levou as pessoas às ruas em protesto, dois dias antes do previsto “Dia da Fúria” de protestos em todo o país.
A organização Human Rights Watch, estimou que centenas ou mesmo milhares de pessoas foram mortas nestes protestos e nos ataques indiscriminados dos mercenários de Qaddafi. Mas nem o massacre da prisão Abu Salim, nem outras violações de direitos humanos perpetrados pelo regime Kadafi nas últimas 4 décadas, foram jamais censuradas pela qualquer organização mundial protetora dos direitos humanos – nem mesmo pelo Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas.
Esta organização, criada em 2006 com um mandato para reformar sua predecessora, a Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas, emitiu 50 condenações nos últimos 5 anos, 35 delas focando em Israel. Nenhuma delas, nem uma só, se referia a qualquer coisa remotamente ligada à Líbia. Enquanto demonstradores estavam sendo metralhados nas ruas de Benghazi, o Conselho das Nações Unidas se mantinha em silêncio assim como seus membros que incluem os Estados Unidos e a União Européia, efetivamente se esquivando de suas obrigações.
Em vez de ser condenada, a Líbia tem sido incentivada. Em maio de 2010, acreditem se quiser, a Líbia foi absurdamente eleita membro do Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas. Nenhum país se opôs, nem mesmo da administração Obama – que havia se oposto à candidatura do Irã. Esta foi a culminação de uma subida constante da Líbia a todos os postos diplomáticos chaves das Nações Unidas, incluindo a presidência da União Africana, o Conselho de Segurança e a presidência da Assembléia Geral da ONU.
Num desvario de 100 minutos em 2009 na Assembléia Geral, Kadafi comparou o Conselho de Segurança da ONU a um “conselho de terror” por causa do direito de veto que possuem os Estados Unidos e os outros 4 membros permanentes.
Um mês antes, o homem que foi chamado pelo presidente Nixon de “o cachorro raivoso do Oriente Médio”, se encontrara com o então candidato à presidência americana John McCain. No dia seguinte, McCain colocou em seu twitter que o encontro foi interessante com um homem interessante. Semanas após o encontro, Kadafi ignorou o pedido de McCain de não dar uma recepção de herói ao terrorista do vôo 103 da Panam Abdel Basset Ali al-Magrahi, que havia sido solto da prisão na Escócia, supostamente por questões humanitárias.
Se os leitores se lembram, Kadafi ordenou o ataque terrorista ao vôo da PANAM que explodiu sobre a cidade Lockerbie na Escócia, matando 243 passageiros, 16 tripulantes e 11 escoceses no solo.
Toda esta ascensão da Líbia no âmbito internacional foi resultado de uma política desenhada pelos burocratas do Departamento de Estado Americano que acham que estão lidando com crianças e usando da mesma psicologia de reforço positivo. Eles acham que se abraçam estes ditadores e lhes dão papéis importantes nestas organizações internacionais, eles perderão a vontade de fazer o errado e aprenderão a se comportar. Isto provou ser um verdadeiro desastre, mas não é a vida das famílias destes burocratas em Washington que está em risco e eles são pagos para criarem experiências.
Mas eles deveriam levar em conta que outros métodos se mostraram mais eficientes para controlar estes ditadores do que tapinhas em suas costas. Não é preciso lembrar que foi por causa da invasão americana no Iraque que Qaddaffi, convencido que ele seria o próximo, magnanimamente decidiu destruir seu programa nuclear nascente e revelar quanto ele tinha em armas químicas. As mesmas que ele está ameaçando usar em seu próprio povo.
Apesar de hoje os Estados Unidos não terem mais a influência no Oriente Médio que tiveram um dia, ainda podem sair da posição defensiva de vetar as dezenas de resoluções contra Israel que são apresentadas todos os dias, para uma posição ofensiva contra todos estes países que sim, ferem os direitos humanos de seus cidadãos e de estrangeiros que se encontram em seu território.
Talvez se maior pressão houvesse sido aplicada no caso de Kadafi, se suas violações dos direitos humanos tivesse sido levada à frente das discussões e debates, líderes como Hugo Chavez da Venezuela ou mesmo o Lula no Brasil, pensassem duas vezes antes de chamá-lo de amigo e mestre. E isso talvez fizesse Kadafi ouvir e seus cidadãos não estariam sendo literalmente massacrados nas ruas das cidades da Líbia.
No mínimo, as Nações Unidas e outras organizações que se auto-entitulam defensoras dos direitos humanos teriam mantido um módico de legitimidade moral ao não patronizar regimes de “cães raivosos” como o de Kadafi.
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