A batalha por Aleppo acabou. O
regime do ditador xiita Bashar al-Assad e seus aliados, a Rússia, o Irã e as
milícias paramilitares da Hezbollah venceram.
Aleppo era a cidade mais
importante da Síria, o centro comercial do país. Damasco, a capital, era a
segunda. A importância da cidade remontava a seis mil anos antes da era cristã
tendo sido um dos polos da Rota da Seda até 1869 com a inauguração do Canal de
Suez.
Aleppo antes da Guerra
Visitei Aleppo em 1998, sua cidade velha, o mercado fechado mais antigo do mundo com as especiarias moídas na hora, os deliciosos sorvetes e doces, sua arquitetura medieval e artesanato, a enorme cidadela que pelo que dizem foi visitada pelo patriarca Abraão, e a grande mesquita construída sobre o gigante templo romano de Júpiter.
Mercado de Aleppo antes e depois da Guerra
Só não pude visitar a Sinagoga
Central aonde meus ancestrais rezaram,
porque era proibido. A mesma sinagoga que abrigou por 600 anos, o Codex, a mais
antiga Bíblia completa conhecida. Até 1947.
Sinagoga Central de Aleppo
Logo após a ONU ter
votado pela partilha e a criação de um estado judeu, a população de Aleppo
perpetrou um pogrom contra a população judaica da cidade. 75 judeus foram
mortos, centenas foram feridos. Dez sinagogas, cinco escolas, um orfanato e um
clube de jovens junto com várias lojas e 150 casas de judeus foram queimadas e destruídas.
Durante o tumulto o Codex foi perdido mas parte dele reapareceu em Israel em
1958. No dia seguinte ao pogrom, metade dos judeus fugiu da cidade e nos anos seguintes
o resto da comunidade judaica deixou a Síria para sempre.
Sem fazer comparações quanto à
magnitude da destruição, as imagens que nos chegam hoje de Aleppo lembram as
fotos tiradas das casas e sinagogas depois do pogrom.
Destruição da Sinagoga 1947
Destruição de Aleppo hoje
Quem poderia imaginar que
após ter sobrevivido todas as invasões da história, Aleppo ira sucumbir a uma
guerra civil religiosa entre sunitas e xiitas?
Até agora, mais de 300 mil
pessoas foram mortas na Síria e milhões fugiram de suas casas e não há qualquer
esperança que a situação se resolva num futuro próximo. Sobrou apenas negociar a
evacuação da população civil e rebeldes.
Com cinco semanas para transferir
a presidência para Donald Trump, Obama deixa a Casa Branca sobre as ruinas de Aleppo.
Seu legado sobre o Oriente Médio será todo este horror e sua herança para o próximo
governo, será este fiasco de proporções bíblicas.
O que a mídia interpretou ser
uma busca informada e resoluta para reinventar o Oriente Médio em seu discurso
no Cairo em 2009, resultou em uma mostra de ignorância, arrogância, ingenuidade
e negligência de Obama. A consequência foi múltiplos banhos de sangue e perdas
estratégicas na região que agora culminaram com a queda de Aleppo. O discurso
foi intitulado “Um Novo Começo”. Nele Obama citou o Corão, pediu desculpas pelo
envolvimento americano no golpe do Irã de 1953, censurou a França por proibir o
uso do véu e bradou para a audiência muçulmana delirante que “os assentamentos
têm que cessar”!
Naquele momento, a politica do
presidente Teddy Roosevelt de "falar manso e carregar um bastão longo foi substituída
por “grite e não carregue qualquer bastão”. Naquele momento também, o mundo
começou a perder o medo do Tio Sam.
Apenas uma semana após o
discurso, os aiatolás roubaram as eleições no Irã, assassinaram e prenderam centenas
de manifestantes pró-democracia e Obama ficou quieto. Um ano e meio mais tarde,
Obama lembrou de sua voz e a usou para defender o resultado das eleições no
Egito que colocaram a Irmandade Muçulmana no poder, jogando seu aliado Hosni
Mubarak para baixo do ônibus. Quer dizer, no Irã era ok não respeitar as
eleições...
Aí veio a guerra na Líbia,
quando ele cunhou o oximoro “liderar por trás” e sua promessa de atacar a Síria
se ela usasse armas químicas contra civis. Em 2013, John Kerry chamou o ataque
químico de Assad uma “obscenidade moral”. Mas não obsceno o suficiente para
agir.
No Egito, os islamistas já
tinham sido removidos do governo mas Obama decidiu boicotar o novo governo de
Al-Sissi. Aí a Rússia abocanhou o mercado de armas egípcio. Mas Putin não parou
aí.
Vendo que Obama era um tigre
sem dentes, a Rússia anexou a Crimeia e parte da Ucrânia. Ao mesmo tempo, ela
triplicou suas forças na Síria e com toda a passividade em Washington, a Rússia
decidiu entrar na guerra ativamente.
Do outro lado do mundo, a
China também se aproveitou da fraqueza de Obama e apressou a construção de
ilhas para expandir seu mar territorial, provocou navios japoneses, coreanos e
filipinos e implantou uma plataforma offshore nas ilhas Paracel.
Por cima de toda esta falta de
lei e ordem no mundo, o Oriente Médio que Obama achava poder pacificar com
algumas frases de efeito, vomitava seus cidadãos numa onda migratória nunca antes
vista, colocando em perigo não só o futuro da União Europeia, mas o sistema
internacional como um todo.
Este é o resumo do governo
Obama que hoje resta sobre as cinzas de Aleppo. Com as cortinas caindo sobre sua
presidência, Obama precisaria pedir desculpas. Primeiro para as vítimas e as famílias
massacradas, refugiadas, empobrecidas, por sua total incompetência e sua falta
de visão, dando passagem livre a Assad o homem que hoje detém o recorde de ter
matado mais árabes que qualquer outra pessoa na história; segundo, ao povo
americano, pois em oito anos ele jogou na lixeira 70 anos de trabalho e dominação
na região sem qualquer coisa em troca, e sem um plano B; e finalmente Obama deve
pedir desculpas aos aliados árabes que perderam total confiança na América.
O próximo presidente Donald
Trump parece saber que o islamismo radical junto com a política de expansão da
Rússia são os inimigos do dia. Seus discursos são claros quanto a isso. Não é
atraente ou bonito, ou muito menos politicamente correto ou humanista como a
mídia e os idealistas gostariam. Mas diferentemente do Cairo em 2009, Trump
sabe que ele precisa restaurar não só a sanidade, mas a sentido de realidade no
governo americano.
Nesta semana 82 civis foram
massacrados por milícias xiitas da Hezbollah em Aleppo. Eles entraram nas casas
de sunitas e atiraram em todos, mulheres, crianças, velhos. Mataram também
todos os médicos e pacientes que se encontravam no único hospital restante no
leste da cidade. O mundo ficou silencioso. Da mesma forma que em Ruanda,
Srebrenica, Darfur, Afeganistão, Iraque e no Monte Sinjar dos Yazidis, o mundo
continua a preferir dar condolências e prêmios às vitimas do que pegar em armas
e defender os inocentes.
O Nunca Mais dito após
o Holocausto para justificar a criação da ONU, foi apenas um slogan. O silencio
desta organização, sem mesmo uma reunião do Conselho de Segurança sobre o
destino de Aleppo é ensurdecedor. Como finalmente confessado por Ban Ki Moon nesta
semana em seu discurso final como Secretário Geral, o foco da ONU é
desproporcionalmente Israel. Achamos que no século 21 estaríamos mais
esclarecidos, mais civilizados. Acho que os Hunos poderiam nos dar algumas
lições de humanidade. E este é o mundo que estamos deixando para nossos filhos.
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